O GOZADOR

 
 

SONETO VI

30 de novembro de 1946

 

Quem no Gozo consome a luz divina,

          Audaz queimando a lúcida candeia,

          Do Capitólio vai para a Tarpéia,

          Na cova onde a aflição ruge e domina.

 

          Desventurado intento, dura sina,

          Do gozador que, mísero, tateia,

          Rogando claridade à casa alheia,

          Ao resplendor solar que ele abomina.

 

          Desgraçado o destino que se entrega

          À prepotência vil, à guerra acesa

          Dos instintos da carne escura e cega!

 

          Ó Céus! que atroz suplício, que tristeza

          No mendigo da luz, que a luz renega

          Às trevas abismais da Natureza!

 

            Ensina que, pelo cultivo do gozo físico e de outras modalidades de sensações materiais, o homem extingue em si mesmo a luz divina da espiritualidade; a criatura se torna cega para os atributos da alma, para as atividades do Espírito: faz-se materialista. Põe-se a mendigar fora de si a luz que, por sua própria vontade, lançara à voragem da animalidade, da natureza inferior. Sem a luz, que “ele abomina” e que, no entanto, procura, estando nela imerso, o homem nada vê e em nada acredita. O poeta nos diz, portanto, que cada um de nós possui uma centelha divina que cumpre cultivar, e não extinguir, para que, com essa luz própria, possa cada um guiar-se, afastando-se do local de onde se lançaria ao abismo dos condenados; nesse báratro, impossível lhe é receber um raio de luz, uma vez que não se encontra em condições de ser esclarecido. Nova advertência, pois, contra a desmedida obediência aos imperativos da matéria, ampliando a contida no Soneto III.

 

Livro:  Volta Bocage...

            Francisco Cândido Xavier, pelo Espírito Manuel Maria de Barbosa Du Bocage,

            apreciação, comentários e glossário pelo Prof. L. C. Porto Carreiro Neto

            FEB – Federação Espírita Brasileira