RECORDANDO OS NATAIS COM CHICO XAVIER

          Recordo-me que nós, os frequentadores do Grupo Espírita da Prece, em Uberaba (MG), aguardávamos a chegada do Natal, com ansiedade, para que, na agradável companhia de Chico Xavier, comemorássemos o nascimento de Jesus. Na véspera do dia 25, saíamos da casa do médium, em pequena caravana, percorrendo os bairros pobres da cidade, deixando para trás as tertúlias e os lautos banquetes com que costumávamos festejar a noite de Natal. Os nossos familiares, a princípio, estranhavam aquela nossa mudança de hábito; muitos, inclusive, rotulando-nos de fanáticos: - “Onde é que já se viu – diziam – deixar de passar o Natal com a família e com os amigos para visitar a periferia?!...”.

          Mas nada, de fato, se comparava àquela alegria íntima que Chico nos proporcionava, desfrutando de sua convivência – sentíamos que, em verdade, nunca festejáramos o Natal de forma tão condizente!

          Partíamos por volta das 20 horas do dia 24, e a abençoada peregrinação só era concluída na madrugada do dia 25, quando, há exatos dois mil anos, Jesus veio ao mundo ensinar-nos justamente o que Chico Xavier estava novamente nos ensinando – o amor aos semelhantes. Em torno das 3 horas da manhã do dia de Natal, escutando o cantar dos galos da vizinhança e sob o brilho sereno das estrelas irmãs daquela de Belém, acompanhávamos o médium numa prece, antes que fraternalmente nos abraçássemos e nos despedíssemos. A prece de encerramento da nossa peregrinação natalina era feita na casa de uma senhora, que nos recebia com bolos, biscoitos e pães-de-queijo, que se fazia acompanhar de fumegantes chás aromáticos – chá de canela, de cravo, de maçã e... um café feito na hora para quem desejasse espantar o sono.

          Era um exercício de paciência e de bondade. Em cada casa visitada por nós, Chico deixava uma pequena lembrança – brinquedos para crianças, roupas, pães, doces e, principalmente, muita alegria. Ele não tinha pressa – aliás, Chico nunca teve pressa. Entrava em todas as casas, conversava, sorria, fazia uma prece, contava uma história... Ia se revezando, de braços dados com uns e outros – todos esperávamos o momento de dar-lhe o braço e de ouvir-lhe mais de perto as palavras iluminadas de sabedoria. De quando em quando, no meio da noite, ele parecia fitar algo no céu estrelado e se transfigurava em silêncio, com os olhos marejados...

          Seguindo-o no carro que o conduzia, adentrávamos ruas estreitas quase intransitáveis, chegando a choupanas erguidas à beira de despenhadeiros ou a palhoças que, para ele, com certeza sugeriam uma estrebaria – era como se ele estivesse, naquela noite, numa roupagem diferente de rei, procurando avidamente, como três outros reis haviam procurado, o local do nascimento de uma criança...

          A peregrinação natalina de Chico Xavier, no entanto, começava nos primeiros dias de dezembro: a grande distribuição de cestas básicas no Grupo Espírita da Prece, a visita ao leprosário em Goiânia, aos doentes de fogo selvagem em Uberaba, aos presos do Carandiru, em São Paulo...

            Diversas instituições espíritas sempre receberam de suas mãos algum tipo de auxílio para suas campanhas de Natal – doações financeiras que ele repassava, tendo o cuidado de colocar o dinheiro dentro de um envelope e de entregá-lo com a maior discrição possível. Nós mesmos, dele recebíamos para o Natal do Bittencourt Sampaio, a Márcia para o Natal da Cantina Maria João de Deus, o Sr. Joaquim Cassiano para o Natal do Vicente de Paulo, os irmãos João e Lázaro para o Natal do Lar Espírita de Lázaro...

          Interessante é que, por vezes, nos melindrávamos, porque ficávamos enciumados de outros companheiros ao seu lado; não tínhamos ainda percepção da grandeza daquela ora! Entendendo nossa infantilidade, Chico procurava dividir atribuições conosco: uns repartiam pães, outros tomavam conta das filas que se formavam nas ruas, alguns transmitiam passes nos doentes acamados ou proferiam preces...

          Em um casebre humilde, as crianças o recebiam com flores e canções natalinas; noutra residência pobre, folia-de-reis o esperava com bandeira do Divino – cantavam para ele, e ele, o tempo todo, segurando a bandeira... Lá fora, a multidão que sempre se aglomerou ao redor de Chico Xavier! Às vezes, tínhamos que sair às pressas: era muita gente para pouca coisa. Ainda não sabemos multiplicar pães e peixes para mais de cinco mil pessoas, fazendo sobrarem doze cestos...

          Inesquecíveis Natais com Chico Xavier! Inesquecíveis dias de tantas saudades e recordações!...

          De permeio, a sua mediunidade ímpar, sublime e bela! – as notícias de Jesus, as interpretações dos ensinamentos do Mestre, os recados do Mundo Espiritual, o agradável perfume dos campos da Galileia, o marulhar das águas do Tiberíades e o colorido das flores que margeavam as estradas de Cafarnaum...

 

          Chico, sem dúvida, é maior homem do que médium! A sua presença entre nós é algo da presença do próprio Cristo!...          

 

Livro:  Chico Xavier, o Apóstolo da Fé: 75 Anos de Mediunidade

Carlos A. Baccelli

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