“O ABISMO”

 

ANÁLISE DO LIVRO “O ABISMO”
José Passini
A obra Libertação, de André Luiz, veio trazer mais detalhes sobre regiões purgatoriais ou infernais
que já haviam sido referidas em livros anteriores, como Nosso Lar e No Mundo Maior. Nela, o
Autor descreve, com clareza e concisão, o panorama onde se organizam forças do mal, como agem
junto a encarnados e desencarnados. É um trabalho de informação e de alertamento, pois que revela a
existência de verdadeiras organizações constituídas por inteligências poderosas, infelizmente voltadas
ao mal. O leitor, ao final da obra, terá uma visão equilibrada do mundo espiritual inferior, face ao ensinamentos
nobres que permeiam as descrições e os relatos de situações negativas.
No livro “O Abismo”, temos uma exaustiva exposição de quadros e panoramas deprimentes,
uma descrição repetitiva de formas monstruosas adquiridas por criaturas que permanecem no mal. Não
se vê, ao longo da narrativa, um aceno de esperança, uma palavra de misericórdia. Apenas a mensagem
mórbida, que parece ter mais o objetivo de apavorar do que de informar. Além das descrições aterrorizantes,
a obra contém verdadeiros absurdos, facilmente constatáveis:
Cap. 1- “Meu pensamento foi assaltado por vibrações vindas do seio da Terra. Senti como
se um poderoso aparelho detonador me atingisse as fibras mais íntimas e me precipitasse em sintonia
com a morte. (...) Forças desconhecidas agiam no meu subconsciente e me atraíam para
perigoso abismo.” Como pode um Espírito que será levado a regiões abismais – por um Benfeitor –
ser atraído dessa forma por forças emanadas do mal?
“Meu ser crescia, crescia sempre como se eu me tornara um boneco de borracha porosa
que se dilatasse indefinidamente. (...) Mergulhei no firmamento e subi, subi sempre. Lá embaixo
começou a ficar a Terra, perdida no oceano do universo. Não sabia a que alturas haveria de atingir,
mas via o mundo fugir de mim como a criança que contempla a sua bolinha de vidro perderse
nas águas do mar.” A que distância da Terra teria sido levada essa criatura para vê-la dessa forma?
André Luiz diz que, de Nosso Lar, contempla a lua. O Autor deveria ter ido muito além do nosso satélite
a fim de que pudesse ver a Terra tão pequena...
Cap. 2 - Ao descrever o Espírito que seria seu guia nessa jornada, o faz de modo singular: “longos
cabelos brancos, ligeiramente enrolados como se fossem cordas, desciam-lhe pelos ombros.
Rosto enorme, redondo aquadradado sobre um pescoço taurino e peito descomunal.” Temos aprendido
que o Espírito, à medida que se aprimora, suas formas se tornam cada vez mais harmônicas e
belas...
“Olhei a Terra: ainda estava lá embaixo, perdida na vastidão do universo.” Depois o guia o
esclarece, dizendo que estão “Entre as esferas do Sistema Solar, porém a uma distância de 325.000
quilômetros da Terra.” Sabe-se que a distância média entre a Terra e a Lua é de 384.000 quilômetros...
Não teria sido mais fácil dizer que estavam entre a Lua e a Terra, se estivessem mesmo a essa
distância. Mas o guia disse-lhe que estavam entre as esferas do Sistema Solar...
Cap. 3 - “Contemplei a Terra que semelhava realmente uma laranja de formato irregular
e estranho. Não era a forma redonda que nos é representada nas escolas e ginásios do orbe, mas
sim um corpo repleto de saliências (...)” Como pôde ver o relevo da Terra, se a via do tamanho de
uma laranja? Onde o senso de proporção?
Cap. 4 - Desse ponto, partiram diretamente para o interior da Terra “em demanda das profundidades
e dos abismos onde habitam os Gênios da sombra e do mal.” O modo de se locomoverem
no espaço é inusitado, completamente diferente dos exemplos apresentados por André Luiz. “Orcus
segurou-me fortemente e compreendi que diminuíamos a velocidade como dois torpedos que
chegassem ao objetivo. Em seguida pousamos na ponta de um penhasco.”
Veja-se em Voltei, como Bezerra de Menezes conduziu um grupo de Espíritos a várias colônias
espirituais; e como André Luiz descreve, em várias obras, a maneira vagarosa de se deslocarem. Em Os
Mensageiros, conduzido pelo Benfeitor Aniceto, usam um veículo para atingirem a crosta terrestre. Em
toda a obra psicografada por F. C. Xavier não há exemplos de Espíritos se deslocando no espaço como
torpedos ou foguetes...
Cap. 5 - “À nossa frente, numa distância indescritível para o pensamento humano, contemplei
uma criatura de grandeza excepcional e de uma perfeição assombrosa. Tão belo que produzia
na minha alma verdadeira vertigem. Acreditei enlouquecer. Pousado no penhasco mais
elevado e pontiagudo, com longas asas descendo-lhe sobre as espáduas cintilantes um Anjo de
sublime beleza dominava o abismo.
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– Aquele é Gabriel, que assiste diante de Deus, – declarou Orcus com acento carinhoso e profundo.”
É de se lamentar que essa obra, bem como Sexo além da Morte, do mesmo Autor, tenham recebido
não só acolhida de leitores, mas também o apoio de um escritor que escreveu artigo elogioso publicado
em periódico espírita. Segundo o Novo Testamento, Gabriel foi o Espírito incumbido de anunciar
a Maria que a criança que ela trazia no ventre era o esperado Messias, e que, segundo Humberto de
Campos, desempenhou também a nobre tarefa de protetor do casal. É espantoso que agora se tenha
transformado numa espécie de Cérbero, ou carcereiro dos abismos...
A fim de não perdermos tempo, deveríamos parar a leitura por aí, mas vamos um pouco mais
adiante. Para não haver dúvida sobre a condição alada de Gabriel, temos ainda a seguinte afirmativa,
logo adiante: “Gabriel sobre o abismo parecia amoroso pássaro de dimensões indescritíveis alimentando
o abismo como sol que do alto do firmamento alimenta a Terra.”
Cap. 9 - Convém observar, com cuidado, o que o Autor fala sobre involução, isso sem contar a
confusão absurda que faz ao estabelecer paralelo entre desagregação intercelular e explosão atômica:
“– Realmente, meu caro, há os que precipitaram nas formas vegetais e vivem agora aprisionados
no que se poderia chamar de inércia aparente... São corações aflitos e consciências que foram
caindo, caindo, e atingindo a inconsciência começaram a percorrer para trás a escala da evolução...
Irão até o mineral e descerão um pouco mais. Nessa ocasião poderão sofrer uma espécie de
explosão atômica que desagregará o próprio ser. Dizemos explosão atômica como quem usa expressão
já inteligível na Terra. Na realidade é uma desagregação intercelular mas tão distante de
uma explosão atômica como a velocidade do som para a velocidade da luz.”
Cap.11- Será que o Autor esteve perturbado ou simplesmente está brincando, numa obra que
pretende seja uma revelação?:
“Quem éramos nós? Seria ele o Alighieri ou seria eu?
– És tu Virgílio e sou eu o Dante ou és o Dante e sou Virgílio?
– As palavras e o pensamento de Dante foram truncados, modificados, alterados, para
satisfazer aqueles que vendem a própria alma se preciso for. Retornamos ao Abismo para restabelecer
a verdade. Tens medo?
Note-se que a 1a. e a 2a. partes de A Divina Comédia, ou seja o Inferno e o Purgatório foram
publicadas quando Dante ainda estava encarnado. Só a 3a. parte, o Paraíso, foi publicada depois de sua
desencarnação. Logo, a afirmativa sobre adulteração que teriam sofrido essas partes, que se referem
justamente às zonas inferiores, não é verídica. O texto que se conhece hoje é o mesmo que foi dado a
público no século XIV.
Cap. 14 – Neste capítulo, fica-se sabendo que há uma lei no Abismo e que o seu texto encontrase
grafado em pergaminho, que se encontra encerrado numa caixa metálica. “Mas quem faz essa lei é
o ser a quem chamamos Dragão e que a Igreja denomina Lúcifer. No momento, está prisioneiro,
acorrentado, no centro da praça. Olhe lá e veja bem no centro mesmo dessa praça onde se observa
uma espécie de fonte luminosa existe alguém acorrentado. Conquanto a fisionomia lembrasse
a fisionomia de um homem ou de um espírito de forma humana, estava tão distanciado de nossa
espécie quanto um dinossauro de um homem. Descomunal, pernas que lembravam colunas de um
edifício, pés que mediam muitos metros de altura, braços cabeludos (...) rosto enorme de mais de
quinze metros onde dois olhos maus lançavam chamas.” Realmente, é até difícil de se comentar...
O Autor pergunta ao seu guia por que aquele Dragão não arrebentava as correntes que o prendiam,
tendo recebido a seguinte resposta: “– O Senhor não permite. Contudo lhe foi concedido por
Deus certo tempo de liberdade e em breve reinará livre das amarras com permissão divina. Sim.
Deus na Sua Misericórdia lhe dará oportunidade para redimir-se. Segundo estamos informados
terá concessão para subir em breve tempo à superfície da Terra e estabelecerá uma luta contra o
Bem durante mil dias. Depois será vencido. Os homens ficarão nessa época entregues ao seu livre
arbítrio, exclusivamente a ele. Os que forem verdadeiramente bons subirão a regiões mais altas
de consciência e os que somente parecerem bons rolarão nos abismos da inconsciência.” Isso não é
uma réplica da tentação pelo Demônio, agora com tempo limitado? Sabemos que estamos sempre de
posse do livre-arbítrio, e não apenas na dita época. Sabemos, também, que sempre temos a assistência
espiritual que merecemos, mas o Autor diz que não haverá nenhuma interferência dos Bons Espíritos
nesse período. Por que Deus iria permitir ao Dragão reinar livre das amarras, significando com isso
oportunidade de redimir-se? Como pode alguém redimir-se laborando no mal? O que significa rolar
nos abismos da inconsciência ?
Ainda falando sobre o Dragão, o Guia diz: “Sua consciência culpada terá oportunidade de
aproveitar a experiência humana assim como receberá da Terra vibrações transformadoras que
há milênios o homem lança na superfície. Os dragões também fazem parte da criação divina. A
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parte mais embrutecida da Terra. Lembram os mamutes, os brontozauros e os sáurios. São a
natureza primitiva que retém os elementos primários e embrionários no nosso sistema. Afinal o
que são esses dragões? Já teriam sido humanos? Se não o foram, trata-se de seres que, por não terem
atingido a humanização, não teriam condições de tentar ninguém, mesmo porque o Autor diz que eles
“São a natureza primitiva que retém os elementos primários e embrionários no nosso sistema.”
Além do mais, se o homem lança vibrações transformadoras capazes de transformar um dragão, tornando-
o bom, por que o homem não as aproveitaria em seu próprio benefício?
Cap. 21 – Aqui vemos um Espírito que tomou a forma de uma árvore, com suas raízes plantadas
no solo. Depois de recusar a manifestação amorosa de um Espírito Superior, diz: “Eu não reconheço
nem aceito Deus! – revidou o vegetal humano. Ele que me encarcerou na maldição desta forma
não pode esperar o meu respeito nem o meu amor! E num grito de terrível angústia a árvore desesperada
sacudiu-se toda e contraiu-se enrodilhando-se como uma serpente.” Sem comentários!
Cap. 26 - Intitula-se, este capítulo Na Gelatina. Além das formas já descritas dessa imensa fauna
e flora humana, agora aparecem os peixes imersos em gelatina, a respeito dos quais o Guia dá a seguinte
explicação: “São seres que voltam na escala evolutiva Esta é a fase que na superfície poderíamos
considerar aquática. A centelha mental aí está quase petrificada (...) Ultimamente tem-se
lembrado muito de suas derradeiras experiências na Terra. Depois, o Guia diz que essas lembranças
datam de vinte mil anos...
Cap. 29 – “E a mente desintegrar-se-á algum dia? O Autor pergunta. Ao que responde o Guia:
A destruição do ser na sua maior intimidade que é a mente, meu filho, reduto sagrado da divindade,
também pode ocorrer mas isso só mais tarde poderemos compreender.” Aí, pergunta-se:
Onde fica a imortalidade da alma?
Cap. 31- Mais um contra-senso: “Lembravam formas femininas de diafaneidade inconcebível.”
Essas criaturas tinham uma tarefa pouco compatível com a sua elevação, qual seja: “São nossas
irmãs designadas para vigiar um dos desfiladeiros do abismo, apresentou alegremente Atafon.”
Mais adiante, diz que essas irmãs, Temp e Tera, oriundas de Vênus, pertencem a turnos de oitocentos
anos e que seriam substituídas por dois homens, Irus e Urus, já escolhidos, pelo Conselho Venuziano,
após entendimento com o Governador da Terra. A Presença de Espíritos Superiores, no desempenho
dessa tarefa, contrapõe-se o argumento do Ministro Flácus (Libertação, cap. 1), quando comenta o poder
exercido por Espíritos inferiores, a título precário, nas zonas de sofrimento: “seria ilógico e absurdo
designar um anjo para custodiar criminosos.”
Cap. 34 - Gabriel novamente apresentado como anjo alado: “Víamos, agora, Gabriel perfeitamente.
Sobre grandiosa montanha, de asas espalmadas como uma águia, mãos abertas voltadas
para nós, irradiava luz, força e amor. Era de uma beleza indescritível e o rosto iluminado ofuscava-
nos o olhar. Olhei-o apenas um momento e escondi os olhos nas mãos para não ficar cego.”
Como pode a luz de um Espírito cegar alguém?
Deve ser lembrado que o Autor declara, tanto nesta obra, quanto noutra de sua autoria, “Sexo
Além da Morte” - outra aberração doutrinária - que ambas foram escritas sob a orientação de André
Luiz.
Comentar todas as infantilidades, todos os absurdos, todas as afirmativas anti-doutrinárias contidas
nesse livro exigiria que se escrevesse um outro livro...
A partir dessa obra, tem chegado uma verdadeira enxurrada de produções mediúnicas, não apenas
discutíveis, mas altamente perniciosas ao esclarecimento do Espírito Humano. São os inimigos do
Espiritismo que, cansados de combatê-lo de fora, agora imiscuem-se entre nobres trabalhadores e, como
“lobos com pele de ovelhas”, atacam tenazmente.
É chegada a hora do testemunho daqueles que realmente amam a Verdade, sem alarde nem escândalo,
estudarem, estudarem o Espiritismo a fim de terem condições de separar o joio do trigo, os
bodes das ovelhas!
Obs. As transcrições foram feitas exatamente como estão na obra, respeitando-se grafia e
pontuação.
Título da obra: “O Abismo”
Autor: Rafael Américo Ranieri
Editora: Eco