Revista Espírita de 1869

 De Allan Kardec

 

 

 

Revista Espírita de 1869

 De Allan Kardec
 

52. A música e as harmonias celestes são o tema de duas comunicações transmitidas por Rossini em reuniões realizadas em janeiro de 1869 em Paris, das quais extraímos resumidamente os conceitos que se seguem:

I – Para ser músico não basta alinhar notas sobre um pentagrama; assim só se consegue produzir ruídos agradáveis. Para dar alma à música, para fazê-la chorar, rir, uivar, é preciso que ele próprio tenha experimentado esses diferentes sentimentos, dores, alegria, cólera.

II – A harmonia é difícil de definir e muitas vezes a confundem com a música, com os sons resultantes de um arranjo de notas e das vibrações dos instrumentos. Mas a harmonia não é isto, como a chama não é a luz.

III – A chama resulta da combinação de dois gases e é tangível. A luz que ela projeta é um efeito dessa combinação e é intangível, mas o efeito é superior à causa.

IV – Dá-se o mesmo com a harmonia, que resulta de um arranjo musical e é um feito igualmente superior à causa.

V – Pode-se conceber a luz sem a chama e a harmonia sem a música. A harmonia é um sentido íntimo da alma e é percebida em razão do desenvolvimento desse sentido.

VI – Fora do mundo material, a luz e a harmonia são de essência divina. A harmonia do espaço é tão complexa e tem tantos graus, que muitos me são ocultos.

VII – O Espírito produz efeitos musicais agindo sobre o éter e obtém os sons que deseja.

VIII – A harmonia, a ciência e a virtude são as três grandes concepções do Espírito. A primeira o deslumbra, a segunda o esclarece, a terceira o eleva.

IX – A harmonia é, contudo, tão indefinível quanto a felicidade, o medo, a cólera: é um sentimento, que não se compreende senão quando se possui, e não se possui senão quando se adquiriu.

X – A música, que é a causa secundária da harmonia percebida, penetra e transporta alguns, enquanto deixa outros frios e indiferentes.

XI – Evidentemente, o homem que goza as delícias da harmonia é mais elevado, mais depurado que aquele que ela não consegue penetrar. Sua alma está mais apta para sentir, desprende-se mais facilmente da matéria e a harmonia a ajuda a desprender-se, de onde se conclui que a música é essencialmente moralizadora, desde que leva a harmonia às almas e a harmonia as eleva e engrandece.

XII – A influência da música sobre a alma e sobre o seu progresso é reconhecida por todo o mundo. A razão dessa influência é que é ignorada: a harmonia coloca a alma sob o poder um sentimento que a desmaterializa.

XIII – Se a música exerce uma influência benéfica sobre a alma, a alma que a concebe exerce igualmente influência sobre a música. É assim que a alma virtuosa, imbuída do sentimento do bem, do belo, do grande, e que adquiriu harmonia, produzirá obras-primas capazes de penetrar as almas mais encouraçadas e comovê-las.

XIV – Se o compositor estiver terra-a-terra, como expressará a virtude que desdenha, o belo que ignora e a grandeza que não compreende? Suas composições serão o reflexo de seus gostos sensuais, de sua leviandade, de sua despreocupação.

XV – Moralizando as criaturas, o Espiritismo exercerá então uma grande influência sobre a música,  produzindo mais compositores virtuosos que comunicarão suas virtudes às suas composições e aos que as ouvirem.

XVI – O Espiritismo terá, ninguém duvide, grande influência sobre a música futura. Seu advento mudará a arte, depurando-a. Como sua fonte é divina, tornar-se-á o ideal e o objetivo dos artistas, que lhe pedirão suas inspirações. (Págs. 84 a 90)